Curumin

Se o berlinense Jamie Lidell canta e desconstrói o soul e o funk, no Brasil Luciano Nakata, o Curumin, engrossa o cordão dos reinventores do mistério do samba. Curumin é um típico macunaíma, um transformador do mundo contemporâneo. Sua arte criativa abriu alas com Achados e Perdidos, lançado em 2003 pela YB. Literalmente, um achado da nova discografia nacional que cai no samba para reconhecer o Brasil e pôr os pés no mundo. E a malandragem do Curumin, enfim, chega ao exterior. Mais um para mostrar que o Brasil não é aquele coqueiro que só dá coco.

Curumim viaja com o samba na mala para uma série de shows nos EUA. Costurando subritmos com funk e soul americano, ganhou residência na casa fonográfica do Blackalicious, DJ Shadow, Lyrics Born, entre outros, a Quannum. “Ano passado cheguei a tocar em Nova Iorque e mesmo com um só integrante da banda, a recepção já foi muito boa. A expectativa para esses shows é a melhor possível”, diz Curumin, em release de imprensa divulgado pela sua assessoria. A expectativa tende a se confirmar. Talvez seja mais um caso de artista nacional mais reconhecido no exterior do que por aqui. Curumin já conta até com divulgação de massa. Emplacou a música “Guerreiro” na trilha do game Fifa Street 2.

Tendo alguns tímidos movimentos nos anos 80, com bandas como Fellini, Picassos Falsos, Vzyadoq Moe, Chance e Black Future, o samba voltou a fomentar a vanguarda musical brasileira nos manguezais de Recife, nos anos 90. Os caranguejos com cérebro do Mundo Livre s/a e Chico Science e Nação Zumbi estudaram e manipularam o samba em suas inúmeras combinações e conexões musicais. A Nação Zumbi conectou a áfrica com “Samba Makossa” no CD Da Lama ao Caos (94). Com Samba Esquema Noise (94), Fred Zero Quatro e seu Mundo Livre S/A reverenciou o clássico Samba Esquema Novo de Jorge Ben. Depois foi a vez de Otto colocar o samba na roda da eletrônica com o soberbo Samba pra Burro. Já o Mestre Ambrósio operou o Terceiro Samba (2001) no seu ambiente cultural.

O “Samba do Gringo Paulista”, faixa do falecido produtor Suba, lançada no clássico São Paulo Confessions, caberia para introduzir Curumin neste contexto, mas seria um erro. Afinal, o compositor e multiinstrumentista não tem nada de estrangeiro, apesar da descendência espanhola e japonesa que carrega dos seus pais. É um filho típico da selva de pedra paulistana, cosmopolita e caótica. Cresceu ouvindo samba, mpb, new wave e hip hop. Formou uma banda, Zomba, para praticar derivados de música brasileira e funk americano. Como músico, acompanhou Arnaldo Antunes (que canta em Achados e Perdidos na faixa “Sertão Urbano”) e Andréa Marquee.

Ele é um “Índio que dança na roda”, música instrumental do Achados e Perdidos ambientada pelos grooves cinemáticos do Instituto. No disco, sua origem oriental fala alto e através das dissonâncias que acrescenta à cadência do samba-soul em “Samba Japa”. Esta forma uma bela dupla de ataque (im)pop do disco com “Vem Menina”. A faixa contém a frase que resume a pajelança de Curumin com samba, soul, funk, hip hop: “Deixa que eu te mostro o que não tem explicação”. O dueto com o mestre Nereu Gargalo, do Trio Mocotó, é um destes momentos inexplicáveis e irresistíveis encontrados em Achados e Perdidos. Um caminho para entender a química do ritual do Curumin é pela regência maestral de sons tirados de cavaquinhos, piano fender rhodes, baixo de teclado analógico, moogs. É isso, Curumin é um dos caciques dos novos sons tupiniquins.

Hoje o guerreiro Curumin está no palco do M3 Summit, em Miami, com Jamie Lidell, Coldcut, Lady Sovereign, Vitalic. Está em casa.

Curumin na selva do mundo
Por Carlos Freitas
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